domingo, 15 de janeiro de 2012

Padre Carlos José dos Santos: Um mártir caririense esquecido pela própria história


 Por: João Tavares Calixto Júnior.



(*) 1784 (27 de agosto) – Crato: Viu a luz do dia Carlos José dos Santos Alencar, filho de José Gonçalves dos Santos, português comerciante de tecidos em Crato (de alcunha Surubim–pintado, em virtude de pequenas manchas apregoadas à face) e Bárbara Pereira de Alencar (heroína dos movimentos libertadores de 1817 e 1824). Segundo consta no livro de batismos da Paróquia de Nossa Senhora da Penha (livro 9, 1778-1786), recebeu as bênçãos batismais um dia após ter nascido, tendo como padrinhos o Padre Carlos José Mesquita e Iria Franca de Alencar (irmã de sua mãe).

            Em ordem cronológica, é o segundo filho dos cinco do casal, tendo sido encaminhado ao seminário de Olinda, onde alcançou o presbiterato em janeiro de 1815. Juntamente à mãe e irmãos (o também padre José Maritiniano de Alencar e Tristão Gonçalves), foi dos grados revolucionários das ações independentistas de 1817 e 1824, esta última, conhecida por movimento libertário da Confederação do Equador.

            Sobre sua morte, ocasionada em 1824 por questões políticas decorrentes do movimento do Equador, ocorrem versões cômpares. Conta Irineu Pinheiro em O Cariri (Fortaleza, 1950), ter sido o religioso assassinado num sacovão de serra conhecido por Saco dos Macacos, na fazenda Ponta da Serra, serra dos Beijus, em Aurora. Grafa o historiador nesta obra, em capítulo dedicado ao misticismo, religiosidade, fanatismos e superstições do povo do Cariri, sobre a existência de uma cruz de madeira, cercada de pedras, à beira da estrada do local predito. Segundo o autor, contavam os velhos das redondezas que, há mais de um século (o livro foi publicado em 1950), um padre de nome Carcará se refugiou, por motivos ignorados, seguido de um “cabra” que servia de pagem, no Saco dos Macacos, bem em frente à cruz que, depois, a piedade haveria de erguer à margem do caminho.

            Havia notado este companheiro do padre, que o mesmo, nos alforjes de couro que trouxera por baixo da capa de sua sela, guardava um tesouro: moedas de prata e de ouro que reluziam, convidando-o ao crime, irresistivelmente.

            Acharam ambos, um dia, um canudo - Scaptotrigona depilis (Moure, 1942) – espécie de abelha existente nas caatingas, produtora de mel de paladar deleitoso. Assim, teria então dado por terra o escudeiro do padre, a machado, com o pau onde se arranchara a Mellipona, abrindo bem o oco onde estavam os favos de mel, conseguindo desta forma, tirá-los e saboreá-los.

            Em dado momento, veio ao armígero, que seria de más entranhas, a tentação de matar e roubar o desavisado sacerdote, e num momento de descuido deste, abateu-o à traição o malvado acompanhante, com machadadas na cabeça, arrebentando-lhe os ossos do crânio.

            Teria ainda o pagem, enterrado o corpo numa cova por ele mesmo cavada, sobre a qual teria armado fogueira, cujas chamas iluminaram, durante horas, aquele quinhão aurorense, lúgubre e ermo.

            Todavia, assegura o escritor, não ter sido o padre Carcará assassinado neste episódio, e sim, o padre Carlos José dos Santos, filho da heroína Bárbara de Alencar, morto não por ter sido vítima da ira do simplório ajudante, mas sim, por ser “crismado com o doce nome de patriota”.

Faz Joaryvar Macêdo identicamente em São Vicente das Lavras (Fortaleza, 1984), menção ao assassinato do sacerdote na Serra do Beiju, antigo território lavrense, hoje Aurora, assim como um de seus maiores mentores, o padre Antônio Gomes de Araújo, versa no esclarecedor Naturalidade de Bárbara de Alencar (Fortaleza, 1951), sobre a morte a machadadas do padre filho de Bárbara, irmão de José Martiniano de Alencar e Tristão Gonçalves.

Raimundo Oswald Barroso em Tristão Araripe: alma afoita da revolução (Fortaleza, 2006) compactua com o citado quando escreve: “cai assassinado em Saco dos Macacos, na serra de Beiju, Comarca de Missão Velha”, adversando somente sobre o município ao qual sucumbe o recôndito mártir patriota.

Ao examinar os acervos dos livros de registros das Paróquias de Aurora, Lavras da Mangabeira e Missão Velha (A Paróquia de Nossa Senhora da Expectação de Icó perdeu seus arquivos em virtude de incêndio), na busca por documentação apodítica, não se encontrou o assentamento do falecimento do sacerdote cratense, abolicionista aguerrido, herói autóctone que a própria história tratou de negligenciar.


(*) Trecho de obra em elaboração: No Orbe do Salgado - Esboço Histórico- Científico.




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