quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Personagens esquecidos: O famigerado padre Luís do Calabaço

Por: João Tavares Calixto Júnior (*).


   Em meio a amplo contigente de personagens históricos que pereceram na memória do povo de Lavras da Mangabeira, está um reverendo, célebre em sua época, ao qual aqui, referenciamos como Luis Antônio Marques da Silva Guimarães, ou singelamente, pe. Luis do Calabaço.
  Filho de Antônio Marques da Silva Guimarães e Joaquina Franscisca de Sá, trata-se o religioso, de autor do projeto de implantação da primeira escola pública de Sousa, PB, sua terrra natal. Foi um vigário muito popular ao seu tempo, estando a frente da paróquia de São Vicente Ferrer por 17 anos (1846 a 1863).
   Sobre este paraibano, caem histórias de ações curiosas, como o fato de o mesmo não residir na casa paroquial, e sim, no sítio Calabaço, de sua propriedade, a cerca de sete quilômetros da então vila de São Vicente das Lavras, num sobrado construído próximo à união do riacho do Rosário (margem esquerda) com o córrego das Emas, que inclusive, serviu de guarida a alguns membros da célebre comissão científica de exploração, em sua estada por doze dias em Lavras, no ano de 1859.
   Teve vida marital com Joaquina Maria do Espírito Santo, conhecida por Marica do padre Luis e com esta, formou família com mais cinco filhos (Luis, Joaquina, Maria, Francisca e José), conforme o descrito em seu testamento, provido, aliás de inúmeros bens, e datado de 9 de outubro de 1862. Em um dos poucos livros de óbito que ainda existem na secretaria da paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras da Mangabeira (1839-1864, fls, 317-318), vê-se o registro de encomendação de sua alma, com 54 anos, pelo pe. José Maria Freire de Brito (padre encomendado), no dia 3 de março de 1863.
   Sobre o referido testamento, recaem interessantes passagens, assim, ricamente trabalhadas no clássico São Vicente das Lavras (Fortaleza, 1984), autoria de um dos maiores historiógrafos nascidos do Ceará: Joaryvar Macêdo, lavrense do Calabaço. Dessas passagens, sobre seu testamento, salienta-se o que aqui se transcreve do referido ensaio, a respeito de algumas vontades do pe. Luís: "Quero que o meu corpo esteja vestido como seu eu fosse celebrar, isto é, com sapatos pretos, meias de seda preta, batina, alva, cordão, estola, manípulo e casula, o que tudo tenho. Quero também que se me ponha na mão um cálice de prata, só tirando quando eu tiver de ser sepultado."
   Proveitoso se faz ressaltar, ainda, que uma grande quantidade de objetos de ouro e prata foram deixados pelo sacerdote, assim como cerca de 450 cabeças de gado bovino, 5 engenhos no termo de Lavras (São Caetano, Bacupari, Canabrava, Limoeiro e Caraíbas), várias propriedades (Calabaço, Fundão, João Ribeiro, Bacupari do Baixio, Pimentas, Cachoeira, Alagoa Nova, Olho d'água - os três últimos em Sousa, PB), além de 300 braças no sítio Logradouro, sendo que nestas haviam grande quantidade de utensílios e implementos, assim como açudes e 12 escravos.
   De Marica de pe. Luis, que após o trespasse do sacerdote contraiu núpcias com Antônio Caetano de Galiza, narra-se que às madrugadas das sextas-feiras, transformava-se numa mula que percorria as estradas do riacho do Rosário, onde escaramuçava-se e espojava-se. Em face da mancebia em que viveu com o padre, tornara mal-assombrado o trecho do sítio em que moravam, no qual segundo a crendice popular, era comum aparecerem visões. A respeito do funeral do padre, contava-se ter sido acompanhado por gatos pretos e urubus do Calabaço até a matriz de São Vicente Ferrer, e desta, ao cemitério, por garças. Estórias de botijas enterradas eram apregoadas ainda, porém nunca se viu alguém ter tido proeza à façanha, porquanto, poucos se arriscariam a desenterrá-las visto à suposta aparição de um velho padre de barbas longas, lançador de fogo pela boca.
   Todavia, seu testamento foi passivo de requerimentos. Em 25 de julho de 1863, D. Joaquina Francisca de Sá reivindicava bens na qualidade de "sucessora de seu finado filho...", declarando renunciar à metade da herança à amásia Maria Joaquina do Espírito Santo, embora estivesse no testamento instituído como herdeiros universais seus cinco filhos. A convenção amigável, entrementes, dizia respeito apenas aos bens deixados pelo vigário, requeridos por sua mãe, e mais nada...



(*) Professor, pesquisador.

Nenhum comentário:

Postar um comentário