terça-feira, 1 de novembro de 2011

Lavras (1907): A deposição do Coronel Honório Lima


Joaryvar "Imortal" Macêdo
  
   O mais curioso de todos os casos de deposição, em face do ineditismo que o marcou, ocorreria precisamente no dia 26 de novembro de 1907, em Lavras da Mangabeira. Foi quando dona Fideralina Augusto Lima e o filho Gustavo Augusto Lima, aliados, apearam do poder, a bacamarte, o coronel Honório Correia Lima, também filho dela, aliás o mais velho dentre seus rebentos varões.
   O episódio, na verdade, revestindo características singulares, aparece, no testemunho de informantes, com uma versão, que pode resumir-se como segue.
   Detendo o coronel Honório Correia Lima, de sociedade com a genitora, o poder político, e nomeado para o cargo de intendente municipal de Lavras da Mangabeira, seu irmão Gustavo Augusto Lima, ambicionando as posições ocupadas por ele, exerceu fortes pressões sobre dona Fideralina, no sentido de rechaçá-lo. Terminou ela cedendo às coações, dando-se a conflagração, que resultou na queda de Honório.
   Forte e prestigioso, com o desempenho do mandato de deputado estadual por três sucessivas legislaturas, o coronel Honório, a qualquer momento em que desejasse, facilmente e à revelia de dona Fideralina, conseguiria do governo do Estado sua nomeação para o cargo de intendente de sua terra. Foi o que acabou acontecendo.
   Nomeado intendente municipal, algumas circunstâncias preponderantes apressariam a deposição do coronel Honório, com a qual, inicialmente, não concordara, em absoluto, dona Fideralina, a despeito de ter ficado extremamente descontente e sentindo-se postergada com a referida nomeação. O ato governamental afastara, automaticamente, da intendência seu velho e fiel correligionário, coronel Manuel José de Barros, guindado ao poder, por influência dela.
   Dos mais difíceis, aquele transe para a velha mandona de Lavras da Mangabeira. O filho Gustavo passou a pressioná-la, no sentido de apear do poder a Honório, porquanto já havia este, anteriormente, exercido o cargo por duas vezes, uma interinamente, três mandatos de deputado estadual, enquanto ele, que nunca divergira da orientação dela, até aquela altura, ainda não tivera vez na política do município. Coagida pelo filho, tentou dona Fideralina, por todos os meios, evitar um desfecho violento, insistindo junto a Honório, até por entre rogos os mais patéticos, abrisse mão do cargo em favor de Gustavo. Irredutível, porém, permanecia o coronel Honório.
   Após a última altercação entre ela e o filho, dona Fideralina, em conciliábulo com Gustavo e o coronel Manuel José de Barros, velho e incondicional amigo e correligionário dela, afastado, compulsoriamente, do cargo de intendente face à nomeação do coronel Honório, confabulou com eles em torno da deposição deste.
   O ataque a Lavras da Mangabeira contou com o expressivo apoio dos coronéis Antônio Joaquim de Santana, de Missão Velha, e Domingos Leite Furtado, de Milagres. Expediram eles para a velha localidade cerca de quatrocentos cabras, uma parte do Cariri, e outra procedente de Pernambuco, das regiões do Riacho do Navio e Pajeú das Flores.
   Reunido no território de dona Fideralina, o numeroso e dantesco bando, antes da investida, ouviu dela, dentre outras, esta veemente admoestação: "Quem acertar um tiro no Torto morre!" O Torto era Honório, que, sendo estrábico, assim o alcunharam. Na velha matrona, ciente da gravidade do momento, falara bem alto o instinto materno.
   Não conseguindo resistir ao cerco, o coronel Honório capitulou.
   Derrotado, retirou-se ele, com a família, para a localidade de São Pedro, hoje cidade de Caririaçu...




Transcrição do Livro Império do Bacamarte
Joaryvar Macêdo - UFC, Casa de Cultura José de Alencar,
Fortaleza, 1990.


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