sábado, 2 de junho de 2012

Rápidas pinceladas sobre alguns personagens e mazelas da Povoação da Venda: A questão da seca de 1877 e a decadência da escravatura.


      

        Registrou-se no ano de 1877 uma das maiores secas enfrentadas pelas populações do semiárido brasileiro da história. Maciça foi a migração dos campos para as cidades, assim como a mortandade que se generalizou sobremodo à falta de alimentos na zona rural.
Na Venda, antiga povoação elevada à Distrito da Vila de Lavras em 1870, assim como nos sítios que hoje formam o território atual do município de Aurora, vários foram os vitimados pela fome em decorrência da seca, algoz e persistente. Esclareçamos:
“Aos vinte de novembro de mil oitocentos e setenta e sete, faleceu de fome o adulto Joaquim Gomes, pardo, de idade de doze anos, foi envolto em branco e sepultado no campo (Calumby), sendo depois encomendado por mim. E para constar fiz este e assignei. O Vigário Meceno Clodoaldo Linhares” (Livro de Registro de Óbitos da Paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras, 1877-1885, p.5).
Aos vinte e nove de novembro de mil oitocentos e setenta e sete, faleceu de fome a párvula Úrsula, de idade de quatro anos, filha legítima de Antônio dos Santos e Rita Maria de Jesus, foi envolta em branco e sepultada no Cemitério da Venda, sendo depois encomendada por mim, etc (...)” (Livro de Registro de Óbitos da Paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras, 1877-1885, p.5).
Aos seis de dezembro de mil oitocentos e setenta e sete, faleceu de fome o párvulo José, de idade de dois anos, filho legítimo de Vicente Monteiro e Maria Joaquina, foi envolto em branco e sepultado no Cemitério da Venda, sendo depois encomendada por mim, etc (...)” (Livro de Registro de Óbitos da Paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras, 1877-1885, p.6).
Assim como estes, concernentes à Venda e adjacências, observam-se vários outros registros de falecimentos ocorridos nesta fase, em virtude da seca.  Párvulos padeceram, assim como adultos e idosos, todos, impiedosamente.

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        Precisamente no dia 4 de abril do ano de 1880, realizaram-se na Capela do Menino Deus na Venda, 12 (doze) batizados pelas mãos do Padre João Carlos Augusto, e dentre estes, um de filho de escravos: Era Vicente, preto, filho natural de Carlota do Amor Divino, nascido aos vinte de março do dito ano, que teve como padrinhos a Deodato Lopes de Oliveira e Balbina Maria da Conceição. Assina Meceno Clodoaldo Linhares (Livro de Batismos da Paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras, 1877-1882, p.101).
       Curiosamente, ressaltamos aqui ter sido este um dos últimos lançamentos relativos a escravos nos livros eclesiásticos da Paróquia de Lavras, concernente aos residentes na Venda ou sítios que compunham o atual território de Aurora. Apesar de a abolição da escravatura ter sido oficializada em 1888, diminuíram-se a partir deste ano as referências a escravos, muito comumente citados nos ditos livros de registros. Exemplifiquemos:
     “Aos vinte e um de novembro de mil oitocentos e setenta e três, na Capela da Venda, feitas as diligências necessárias, confessados e crismados na doutrina cristã, sem comprometimento algum, de licença minha, em presença do Pe. Joaquim Machado da Silva e dos testemunhos Antônio da Silva Martinho e Pedro Carneiro de Oliveira, se (ilegível) em matrimônio os nubentes Vicente Ferreira, escravo de Bárbara Maria, com Raymuda Izabel, viúva por falecimento de Antônio Apolinário de Souza. São naturais e moradores, ele no Barreiro, desta Freguesia e ela, na (ilegível), da mesma Freguesia de Lavras, etc... Pe. Vicente Férrer de Pontes Pereira”. (Livro de Registro de Matrimônios da Paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras, 1870-1875, p.141).
“Aos doze de março do ano de mil oitocentos e sessenta e seis foi sepultado no cemitério da Capela da Venda o adulto Antônio Jacintho, casado com Maria, escrava de Manoel Joaquim Carneiro, morador no Barro Vermelho, faleceu de morte natural aos trinta anos de idade do dito mês e ano. E para constar mandei lavrar o termo que assinei. Pe. Antônio Pereira de Oliveira Alencar”. (Livro de Registro de Óbitos, Paróquia de São Vicente de Lavras, 1865-1871, p.40).
  Como estes, diversos outros assentos foram observados, inclusive, de escravos pertencentes ao citado cidadão Manoel Joaquim Carneiro, que como se verá em momento oportuno, foi o primeiro Presidente da Câmara Municipal da Vila d’Aurora, à época, a principal autoridade administrativa do município.
Era o referido Manoel Joaquim Carneiro, que exercera ainda o cargo de subdelegado de polícia na Venda (Tenente), casado com Maria de Jesus Tavares (irmã de Maria de São José Tavares, Alexandre Luiz Tavares e do Padre José Luiz Tavares), e conforme se observa no Livro de Registro de Matrimônios da Paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras (1870-1875, p. 185), assistiu ao casamento realizado pelo Pe. Francisco Tavares Arco-Verde, de sua filha Joana Maria de Jesus, aos 3 de junho de 1875, em sua residência no sítio Barro Vermelho, com Valdevino Leite Teixeira, viúvo este, de Ana Rosa Leite. Da mesma forma, aos 17 de novembro de 1886, viu seu filho José Joaquim Carneiro contrair núpcias com Maria Joaquina da Conceição, filha de José Antônio Carneiro e Maria Joaquina da Conceição (Livro de Registro de Matrimônios da Paróquia de São Vicente de Lavras, 1884-1891, p. 37).     
Outras considerações a despeito de Manoel Joaquim Carneiro, notável figura da historiografia aurorense, sobretudo política, serão anotadas  em textos que se seguirão.



Trechos extraídos de obra em elaboração.


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